Resenha do livro: A natureza da mordida
Li esse livro na velocidade da luz e fiquei completamente apaixonada pela escrita, pela história, pelos personagens, guardei comigo muitas frases que vou levar para a vida, fiquem com a resenha :)
SINOPSE
Olívia é uma jovem jornalista marcada pelas dores do abandono, da solidão e do luto, enquanto Biá é uma idosa e psicanalista aposentada, que carrega o peso de um passado difícil e da ausência de futuro. As duas se encontram ao acaso em um sebo improvisado e começam a se ver com frequência, todos os domingos. Nessas conversas repletas de literatura, conflitos existenciais e passado, uma começa a adentrar nas histórias da outra. O livro altera entre o ponto de vista firme de Olívia e a escrita desconexa e cheia de lacunas de Biá, que se encontra marcada pela velhice e pela perda de memória.
MINHA OPINIÃO
Uma vez me perguntaram se para mim era mais difícil fazer a resenha de um livro bom ou ruim... com certeza fazer a resenha de um livro bom dá o dobro do trabalho, porque nenhuma palavra consegue fazer jus a todos os sentimentos envolvidos em um livro que toca na alma. "A natureza da mordida" é o tipo de livro bom que você julga a sua própria memória por não ter conseguido gravar cada mínima frase, ao mesmo tempo em que essa mesma memória é motivo de alegria porque não saber significa que é possível reler e sentir tudo de novo.
É um livro quase poético que carrega uma história tão ficcional e ao mesmo tempo tão próxima da nossa existência. As personagens são muito humanas, os diálogos são incríveis, a alternância entre os pontos de vista é de uma inteligência surreal, o enredo é fluido e a forma como as lacunas foram se preenchendo ao longo da história me deixou encantada. É o tipo de livro que faz reviver o amor pela literatura, só consegui pensar que sou muito feliz por ter nascido gostando de ler e por ter a oportunidade de conhecer tantas histórias e tantos mundos, que me fazem ser uma jovem com a mente lotada de mil vidas. Olívia é uma menina tentando se reerguer e Biá é uma idosa que não tem mais tempo pra recomeçar, mas se salva a cada dia pela literatura.
Como todo bom livro cult, a autora Carla Madeira fez muitas reflexões sobre a natureza humana (sem perder aquele charme poderoso da ficção), por exemplo as reflexões sobre entender que nem todo mundo é completamente bom ou ruim, que todo ser humano é mais complexo do que aparenta ser e que a vida traz situações que independem da idade, os conflitos existem desde a infância até a terceira idade e todo mundo é um mosaico das coisas que viveu.
Já li o livro "Tudo é rio" da mesma autora e tive que parar para comparar as duas obras. Então cheguei à conclusão de que os dois são igualmente bons, mas com propostas totalmente diferentes, "Tudo é rio" é mais visceral, a metáfora dos fluidos e da vida fazem com que o livro seja praticamente animalesco (inclusive é um dos meus favoritos da vida), enquanto "A natureza da mordida" é mais existencialista, é pras almas solitárias, que se conectam com a arte e que entendem ou querem entender a potência dos acontecimentos da vida (também virou um dos meus favoritos). Cada um dos livros é único ao seu modo, Carla Madeira não repetiu nenhuma fórmula de enredo, não repetiu nenhuma essência dos personagens e cativou com a escrita a ponto de tornar cada leitura uma experiência nova, ao mesmo tempo em que trouxe a familiaridade da escrita tão boa.
Eu poderia passar horas falando desse livro sem nem pensar duas vezes, mas tenho medo de me empolgar e revelar todos os detalhes dessa obra tão incrível. Então vou finalizar deixando algumas frases que eu marquei.
FRASES
"O que você não tem mais que te entristece tanto?"
"A alma não se rende ao desespero sem haver esgotado todas as ilusões."
"E eu já não luto para introduzir no tempo de cada dia eternidades."
"Pouca literatura rende uma vida muito higienizada. Quem pode acreditar no sofrimento cercado de conforto? Quem pode acreditar na literatura sem sofrimento?"
"Penso que a verdadeira tristeza nos deixa sem palavras. Nos tira o volume. É uma goteira pingando lenta em um fim de tarde avermelhado. Uma caneta deslizando no papel sua tinta dolorosa."
"Nada mais destrutivo do que alguém ter razão enquanto sente ódio."
"Antes de ser louca, eu queria a liberdade, essa irmã torta da loucura. Perdi o freio, por isso sou louca, se o tivesse jogado fora seria livre. Danei a gritar de tanto que me esforcei para ficar em silêncio. Tentei não dizer nada falando muito. Não é fácil calar enquanto estou viva."
"Minha loucura é meu corpo em conflito. Ou calo. Ou falo."
"Somos felizes, Olívia, até o dia em que deixamos de ser. Aí notamos que a felicidade não é uma coisa abstrata, nem poética, nem complexa. Ela apenas está lá disponível e é sobretudo a ausência do irreversível."
"O cachorro morde. O cachorro fere na mordida. A carne se rasga na mordida. A fome se mata na mordida. O sangue escorre na mordida. Os dentes se encostam na mordida. As marcas se fazem na mordida. Nada a fazer. A natureza da mordida está lá. A natureza da mordida é implacável."
Espero que tenham gostado da resenha, não vou colocar todas as frases que marquei porque senão acabaria escrevendo aqui o livro inteiro.
insta: @blogdeumaanonimaa
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